“ Incorrigível fabricante de ilusões, o homem (eu, tu, aquele) nunca o é tanto como no último dia do ano. Indiferente como as mais vezes, o relógio dá as doze badaladas. É ouvido em silêncio, com atenção e reverência. (…) Pois no último dia do ano viramos fatos. É um labutar de agulha e tesoura que causaria espanto se não passasse todo ele no íntimo do sujeito. O mentiroso vai ser verdadeiro, o hipócrita será sincero, o leviano descobre que a constância é a virtude que lhe convém, o invejoso já promete aplaudir, o avarento começa a desabotoar as algibeiras. Enfim, o que é mau, prejudicial e nocivo, ali mesmo de desdiz e arrepende. Vai principiar a fraternidade universal. (…)
Ai, ilusões, ilusões, que tão pouco durais. Os bons propósitos da noite não resistem ao dia seguinte (…) mas era preciso um mundo diferente. Primeiro, que todos os dias fossem os últimos do ano, para não dar tempo a arrefecerem promessas. Depois, e aqui é que está a dificuldade maior, que a verdade fosse tão lucrativa como a mentira, que a sinceridade desse mais proventos que a hipocrisia. E por aí fora, trocando tudo."
Feliz Ano Novo.