domingo, 24 de abril de 2022

48 anos de Abril

 De vez em quando leio,  o que está para trás, neste blogue género diário. Há datas que tem sempre uma entrada. Que estão sempre presentes, que não podem deixar de ser escritas ou preenchidas com um a imagem, uma reflexão, um cravo. É impressionante ver, neste exercício, como as opiniões e os contextos se alteram em pouco tempo.

Voltámos a Abril. Volto sempre.  Ainda ontem pintava cravos junto ao coreto, ainda ontem ia em manifestações com os meus pais, ainda ontem a democracia era recente e quando atingiu a maioridade  os partidos e comentadores reclamavam a quem pertencia , ainda ontem as ruas estavam vazias, a  pandemia era o tema central da nossa vida. Ainda ontem se questionava a abertura da assembleia e as comemorações e ainda ontem se anunciava a proximidade da meia década da revolução, e do desaparecimento dos capitães de abril*. Neste amadurecimento ainda há tanto por tratar, ainda há tanta herança de um tempo de miséria, censura, desigualdade, proibição. E entretanto, surgem outros protagonistas, um contexto de guerra na europa, que jamais imaginamos. Um partido que lutou pela liberdade e que agora se afunda numa ideia pouco condizente com os ideias de abril. 

É um outro tempo, uma resistência de pressão, onde o poder da comunicação e do  engagemnet é tudo. Este é o tempo da rapidez da informação, da solidariedade entre a humanidade, mas também do esquecimento, dos egoísmos pessoais, da ganância de um homem e também dos estados e de algo que sem tempo, nem espaço é sempre atual e muda e molda a História - o  poder.  Neste sentido,  o povo da terra da fraternidade não se pode desligar da sua política que é antes de tudo, pensamento e por isso expressão de cultura. « O confronto ideológico representa muito mais do que a luta de contrários, da qual uns saem vencedores, e os outros vencido. Só na interrogação, na pesquisa, na abertura à pluralidade, será possível construir um pensamento autónomo. Esse, uma vez formado, determinará então a prática, a ação*. »

somos filhos da madrugada e disso nunca nos podemos esquecer ou demitir.  

Viva o 25 de Abril. Viva a Liberdade.

* o implicado - salgueiro maia

*as sombras de uma azinheira - álvaro laborinho lúcio


é tudo e só isto*

 ~
Oito dias depois, estavam os discípulos outra vez em casa e Tomé com eles.
Veio Jesus, estando as portas fechadas,
apresentou-Se no meio deles e disse:
«A paz esteja convosco».
Depois disse a Tomé:
«Põe aqui o teu dedo e vê as minhas mãos;
aproxima a tua mão e mete-a no meu lado;
e não sejas incrédulo, mas crente».
Tomé respondeu-Lhe:
«Meu Senhor e meu Deus!»
Disse-lhe Jesus:
«Porque Me viste acreditaste:
felizes os que acreditam sem terem visto».

* Jo 20,19-31
* a incredulidade de s.tomé - caravaggio 1600
*o mais belo texto e imagem da representação da dúvida, do mistério, da humanidade, do dom da fé.

quarta-feira, 20 de abril de 2022

sejam livres as palavras e as cores

Na Ágora os gregos combatem,

Mantêm a honra e o desgosto

Escondidos na harmonia da filosofia.

Dois irmãos brincam no Senado,

Lobos uivam ao redor do Coliseu

E os templos imortais discutem

A superioridade de um ser.

 

Em Alcobaça descansa Pedro

E o seu amor por Inês

No túmulo da bela história

Que o novo reinado assassinara.

 

E nas paredes das Catedrais

Já não dormem os anjos,

Pela luz que atravessa os redondos vitrais

E pelo barulho dos altos sinos

Que se assemelham aos apelos dos que sofrem

E revoltam, trabalham, defendem e desejam

Nas praças, nos palcos,

Quiçá nos salões dos palácios,

Debaixo do Sol divinal,

Pobres das sombras

Que as divindades não conhecem.

 

Luxúria francesa das valsas,

Das chics festas e dos bailados,

O amor quente e maltratado,

Dos chás ingleses sem pinga,

O ouro passa a carvão

E o carvão ao vapor

E o vapor à imensidão da Luz

Que se estingue no seio de uma mulher.

 

A água das naus escorre na forma de suor

Na face dos que na Gare se escravizam.

Acordos são tratados,

Muros derrubados,

Culturas arrebatadas,

Sociedades confinadas.

 

As borboletas novamente queimam

E perde-se a história nos arquivos,

Que ardem e cegam o que é ignorante.

 

Viva aquele que pensa,

Que salva a pátria,

Que castiga e mata.

Sejam livres as palavras e as cores

As algazarras e os espetáculos

E que ao efeito das borboletas estejamos condenados.

 Efeito Borboleta - Marta Silva