Há algum tempo que não consigo escrever neste blogue nada de minha autoria.
As ideias que frequentam o meu pensamento, sempre antes de adormecer, não se
transformam em palavras, daquelas cheias de sentido e profundidade como as que
gosto de ler. Todavia, e deixando para quem de direito o dom da palavra escrita
atrevo-me a deambular, com conhecimento de causa sobre os filhos únicos, animada por um artigo
com um sugestivo titulo SOU FILHO ÚNICO, E DEPOIS?
O artigo foca a realidade dos nossos
dias, que faz com que a maioria dos casais tenha um único filho e de todas as consequências
que isso traz à sociedade. Segundo o
mesmo, os filhos únicos tendem a isolar-se, a ser pessoas pouco dadas à
partilha, à conversa, ao convívio, são o centro das atenções dos seus pais,
correndo riscos de se tornar pessoas mimadas, egocêntricas e solitárias . Talvez o pior
desta nova realidade seja que as crianças e jovens “neste estado” , apreciem
serem únicos e não vêm necessidade alguma de terem um irmão, porque eles têm
TUDO e não precisam de mais nada.
Se agora esta é uma situação tão comum, no meu tempo era uma raridade. E aqui se compreende a
minha tendência para a raro (ironia). Não me lembro de ter amigos ou
colegas de turma, filhos únicos, era sempre eu a única. E nesse meu tempo era
muito comum ouvir dizer-se “ és mesmo mimado vê-se logo que és filho único” .
OU“ o quê?? és filha única, não pareces nada” . Agora a raridade é ter-se um irmão.
Sinceramente nunca pensei muito nesse meu estado. Nunca achei que a
personalidade de cada um dependesse do número ou da falta de irmãos. Nunca me
achei privilegiada ou desfavorecida, era assim e ponto.
No meu tempo brincávamos na rua, íamos
a pé para a escola, partilhava sem problemas os brinquedos e os apontamentos,
tive a sorte de ter uma amiga de sempre que é como se fosse uma irmã, frequentávamos
a casa uma da outra, até hoje.
Vivi sempre bem com a condição de única, apesar da preocupação mais
extremada do meu pai, mais confiante da minha mãe, e de toda a experiência
magnifica que é viver com uma avó, da qual eu acho que herdei um amor pelo
saber ( saber ouvir, saber aprender, saber partilhar, transmitir, fazer…) muito
por isso nunca me senti solitária, o que não quer dizer que não me sentisse
sozinha, mas isso nunca foi um drama.
Perante a doença e as limitações, desejei muito não ser única. Na doença são
muitas as preocupações. São raros os
amigos que ficam. São raras as certezas
sobre o futuro. E aqui não falo tanto por mim, embora me pareça mais que justo
que ninguém fosse raro e único, mas pelos pais que enfrentam, quase que em permanência,
o seu maior desafio, o de assegurar o bem-estar da sua raridade, no presente e
no futuro.
E aqui surge o maior desafio dos filhos, o de apaziguar a sua ânsia, e de
viver nesse estado, que como diz o autor deste artigo António Torrado, é “ algo
para toda a vida. Não algo que apenas se viva enquanto criança…” Não querendo pensar que um dia “ ficaremos órfãos,
sentir-nos-emos sós”.
No Diário das Coisas Impossíveis, o autor João Ferreira Oliveira diz algo, extremamente
irónico e divertido, e que com o qual encerro este meu pensamento: “ainda hoje
tenho uma secreta esperança de que a minha mãe engravide, mesmo já passando dos
sessenta. Nem que fosse para mais tarde perceber, que afinal, não há nada como
ser filho único”.