domingo, 9 de novembro de 2014

sobre os filhos únicos

Há algum tempo que não consigo escrever neste blogue nada de minha autoria. As ideias que frequentam o meu pensamento, sempre antes de adormecer, não se transformam em palavras, daquelas cheias de sentido e profundidade como as que gosto de ler. Todavia, e deixando para quem de direito o dom da palavra escrita atrevo-me a deambular, com conhecimento de causa  sobre os filhos únicos, animada por um artigo com um sugestivo titulo SOU FILHO ÚNICO, E DEPOIS?
 O artigo foca a realidade dos nossos dias, que faz com que a maioria dos casais tenha um único filho e de todas as consequências que isso traz à sociedade.  Segundo o mesmo, os filhos únicos tendem a isolar-se, a ser pessoas pouco dadas à partilha, à conversa, ao convívio, são o centro das atenções dos seus pais, correndo riscos de se tornar pessoas mimadas, egocêntricas e solitárias . Talvez o pior desta nova realidade seja que as crianças e jovens “neste estado” , apreciem serem únicos e não vêm necessidade alguma de terem um irmão, porque eles têm TUDO e não precisam de mais nada.
Se agora esta é uma situação tão comum, no meu tempo era uma raridade. E aqui se compreende a minha tendência para a raro (ironia). Não me lembro de ter amigos ou colegas de turma, filhos únicos, era sempre eu a única. E nesse meu tempo era muito comum ouvir dizer-se “ és mesmo mimado vê-se logo que és filho único” . OU“ o quê?? és filha única, não pareces nada” . Agora  a raridade é ter-se um irmão.
Sinceramente nunca pensei muito nesse meu estado. Nunca achei que a personalidade de cada um dependesse do número ou da falta de irmãos. Nunca me achei privilegiada ou desfavorecida, era assim e ponto.
 No meu tempo brincávamos na rua, íamos a pé para a escola, partilhava sem problemas os brinquedos e os apontamentos, tive a sorte de ter uma amiga de sempre que é como se fosse uma irmã, frequentávamos a casa  uma da outra, até hoje.
Vivi sempre bem com a condição de única, apesar da preocupação mais extremada do meu pai, mais confiante da minha mãe, e de toda a experiência magnifica que é viver com uma avó, da qual eu acho que herdei um amor pelo saber ( saber ouvir, saber aprender, saber partilhar, transmitir, fazer…) muito por isso nunca me senti solitária, o que não quer dizer que não me sentisse sozinha, mas isso nunca foi um drama.
Perante a doença e as limitações, desejei muito não ser única. Na doença são muitas as preocupações. São  raros os amigos que ficam.  São raras as certezas sobre o futuro. E aqui não falo tanto por mim, embora me pareça mais que justo que ninguém fosse raro e único, mas pelos pais que enfrentam, quase que em permanência, o seu maior desafio, o de assegurar o bem-estar da sua raridade, no presente e no futuro.
E aqui surge o maior desafio dos filhos, o de apaziguar a sua ânsia, e de viver nesse estado, que como diz o autor deste artigo António Torrado, é “ algo para toda a vida. Não algo que apenas se viva enquanto criança…”  Não querendo pensar que um dia “ ficaremos órfãos, sentir-nos-emos sós”.  

No Diário das Coisas Impossíveis, o autor João Ferreira Oliveira diz algo, extremamente irónico e divertido, e que com o qual encerro este meu pensamento: “ainda hoje tenho uma secreta esperança de que a minha mãe engravide, mesmo já passando dos sessenta. Nem que fosse para mais tarde perceber, que afinal, não há nada como ser filho único”.

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