quinta-feira, 6 de outubro de 2016

vai o viajante # 10







Vai o viajante a Óbidos, já lá esteve mais que uma vez, mas não deixa de se maravilhar com esta vila dentro de muralhas. A porta de entrada sempre surpreende este viajante, pelo efeito inesperado que provoca o varandim interior, com o oratório rodeado pelos azulejos azuis e brancos e ali ao canto um músico que recebe os que entram com uma sonoridade que ecoa e convida. Leu no seu guia que a vila peca pelo seu excesso de flores que caem por todo o lado, mas isso não perturba este viajante, o que o incomoda é o excesso de turistas e o excesso de lojas de artesanato feito em série. Abstrai-se desse burburinho e procura Josefa de Óbidos. Encontra a sua obra na bela igreja renascentista de Santa Maria, um painel no altar de Santa Catarina de Sena. Na entrada nenhuma referencia artística, apesar da sua riqueza, apenas religiosa  vendem-se velas para acender aos santos.
 Apesar de a vida na vila parecer um pouco artificial, este viajante já não a acha como “ aquela menina  de tempos antigos que foi ao baile e espera que a venham buscar para dançar”. Há mais qualquer coisa, há ruas escritas e anúncios a pedir que não se escreva. Há a preparação de um festival internacional literário. Há uma igreja (há muito fechada) transformada numa livraria. Maravilha. Depois há o castelo transformado em pousada, um espaço dedicado à recriação de tempos medievais, a ginjinha com o copo de chocolate. E o viajante não recusa nada, quer ver tudo. Embrenha-se numas ruas que nunca havia visto, descansa com um belo almoço, compra dois postais e segue para outro destino, ali bem próximo mas tão diferente.
Chega a Peniche, nem sabe bem o que quer ver, mas encontra logo a imensidão do mar e uma encosta com pedras que são placas, e essas formam outras formas que lembram aves, e personagens petrificadas pela força do mar. O vento agita o mar e a paisagem é assustadoramente bela. Em frente as Berlengas. Ao contrário do seu guia, este viajante não faz a menor questão de atravessar aquele pedaço de mar agitado para chegar aquela pequena ilha, tão próxima e tão distante. Lembra-se que há o forte de Peniche, mas o mar prende-o um pouco mais e segue pela costa até ao Cabo Carvoeiro, até ao farol, até à Nau dos Corvos. Impressionante. Como ainda não conhecia este lugar? Devia haver uma lei que obrigasse os portugueses a vir aqui. Ainda com os olhos postos no mar segue para o forte, “aquele que foi lugar de reclusão e hoje tem as portas abertas” . O  viajante perdeu a noção das horas e há uma parte que já não dá para visitar. Aquilo que queria ver, os lugares de onde fugiram presos políticos com uma corda de lençóis a conivência de um guarda prisional e a ajuda de pescadores. Ainda há pouco viu um documentário sobre isso na televisão e agora o porteiro diz que por ele deixava entrar, mas as os horários tem que ser cumpridos. Deixa o forte com pena mas muito satisfeito por já lá ter estado. As horas são de regresso. Terá que voltar num outro dia. O viajante volta sempre.

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