quinta-feira, 16 de abril de 2020

estado da arte #5


o meu turista preferido
talvez nunca tenha sentido na minha vida uma alegria tão incondicional como a que aqui há tempos me chegou numa distraída noticia de imprensa, transcrevo: " um guarda - sol arrastado pelo vento  matou um turista numa praia do adriático" que as potências ocultas hajam deposto num guarda-sol a capacidade executiva de uma justiça que qualquer espírito medianamente são reclamara, pareceu-me da mais subtil e engenhosa fantasia .
o turista como se sabe é logo a seguir à galinha de aviário ou não, o animal menos viável da criação. a sua importância inexpressiva que nem o génesis ou qualquer outro (..) se lhe refere. 
o turista foi concebido e posto em circulação devido ao facto puramente acidental de haver lugares vagos nos meios de transporte e de haver florescimento a mais na economia de alguns países ao mesmo tempo que havia florescimento a menos na economia de outros. 
o turista é destituído de órgãos de visão , de audição, não vê nada, não ouve nada. o seu único órgão é um livro de travelers cheques. os países pobres importam este bicho como penúltimo recurso, o último é a exportação de trabalhadores.
o turista é habilmente manuseado desta maneira: tira-se de um hotel, enfia-se num avião e mete-se noutro hotel. serve- se recheado às bocas famintas. tudo isto dá direito aos pobres de se vingarem de vez em quando.
excelente parece-me ser quando um guarda-sol se faz inteligência dos factos: aparecendo na linha de água e de areia de um conspurcado adriático um cadáver em estado definitivamente turístico...

* eduard hopper, gloucester beach, bass rocks-1924
* o meu turista preferido - herberto helder ( e outros intlectuais que refletem na diferença entre viajantes e turistas) , aqui : agora que nada será como (d)ante 

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